A mitigação de prejuízos no direito brasileiro: quid est et quo vadat?
Palavras-chave:
Reparação civil, ; mitigação de prejuízos, incumbência, obrigação como processo, boa-fé objetivaResumo
A comunidade jurídica brasileira costuma se referir à posição jurídica ativa que permite ao devedor (ofensor) instar o correspondente credor (vítima) a reduzir seu próprio prejuízo como dever de mitigar os prejuízos. Esta expressão, produto de literal tradução do duty to mitigate damages, tropeça nos desafios inerentes à tradução de expressões técnico-jurídicas. Gera, em função disso, graves distorções conceituais. À vista desse problema, propõe-se rasante, mas não perfunctória, análise das noções jurídicas de ônus, dever, obrigação e incumbência, no intuito de aclarar o enquadramento conceitual da mitigação de prejuízos. Vencida esta tormentosa problemática, passa-se em revista a sua razão de existir na ordem jurídica brasileira. Da miríade de respostas diferentes advindas da literatura especializada – a qual aponta para culpa concorrente, causalidade, boa-fé e exercício disfuncional de posição jurídica –, busca-se extrair diretriz uniforme, que permita melhor delimitar as peculiaridades da figura jurídica analisada. Ao cabo, conclui-se que a posição jurídica subjetiva do credor ou da vítima em mitigar evitáveis prejuízos afigura-se, à luz do Direito Civil brasileiro contemporâneo, como incumbência e finca raízes na boa-fé objetiva.
Downloads
Referências
AGUIAR JUNIOR, Ruy Rosado de. O poder judiciário e a concretização das cláusulas gerais: limites e responsabilidades. Revista de Direito Renovar, v.18, pp.11-19, setdez/2000.
AINSWORTH, Janet. Lost in translation? Linguistic diversity and the elusive quest for plain meaning in the Law. In: CHENG, Le; SIN, King Kui; WAGNER, Anne (Orgs). The Ashgate handbook on Legal Translation. Surrey: Ashgate, 2014.
ARNT RAMOS, André Luiz. A responsabilidade civil para além dos esquemas tradicionais: prospecções do dano reparável na contemporaneidade. RFDC. Belo Horizonte, a. 4, n.10, pp.13-33, set/dez 2015.
ARNT RAMOS, André Luiz. Doctrine of mitigation, culpa concorrente e responsabilidade civil por dano moral: a súmula 54 do Superior Tribunal de Justiça e o Direito Civil Contemporâneo. In: PEREIRA, Gabriel Bittencourt; SILVEIRA, Robson Luiz Schiestl; e BRUNETTO, Caroline Araujo (Coords). Temas atuais e relevantes da Responsabilidade Civil. v.II. Curitiba: Instituto Memória, 2015.
BRANDÃO PROENÇA, José Carlos. A conduta do lesado como pressuposto e critério de imputação do dano extracontratual. Coimbra: Almedina, 1997.
CAPELOTTI, João Paulo. O nexo causal na responsabilidade civil: entre a certeza e a probabilidade. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2012.
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2014.
COMINO, Tomas Barros Martins. Desventuras do duty do mitigate the loss no Brasil: nascimento (e morte) de um brocardo. Dissertação (Mestrado) - Programa de Mestrado Profissional da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, 2015.
COUTO E SILVA, Clovis Veríssimo do. A obrigação como processo. São Paulo: José Bushatsky, 1976.
CRUZ, Giselda Sampaio da. O problema do nexo causal na responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2015.
CUNHA FROTA, Pablo Malheiros da. Imputação sem nexo causal e a responsabilidade por danos. Tese (Doutorado) – Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2013.
DULLINGER, Silvia. Bügerliches Recht. Band II: Schuldrecht Allgemeiner Teil. 4ª Ed., atualizada. Viena: Springer, 2010.
EHRHARDT JR., Marcos. Relação obrigacional como processo na construção do paradigma dos deveres gerais de conduta e suas consequências. RFDUFPR. Curitiba, n.56, pp.141-155, 2012.
EHRHARDT JR., Marcos. Responsabilidade civil ou direito de danos? Breves reflexões sobre a inadequação do modelo tradicional sob o prisma do direito civil constitucional. pp. 303-314. In: RUZYK, Carlos Eduardo Pianovksi et al (Org.). Direito civil constitucional: a ressignificação da função dos institutos fundamentais do direito civil contemporâneo e suas consequências. Florianópolis: Conceito Editorial, 2014.
EHRHARDT JR., Marcos. Responsabilidade civil pelo inadimplemento da boa-fé. Belo Horizonte: Fórum, 2014.
ESTAY, Paola Andrea Hermosilla; ESPEJO, Ramón Ignacio Reyes. El deber de mitigar el daño en la responsabilidad contractual chilena. Monografia (Graduação) – Univiversidad de Chile, Santiago, 2013.
FACHIN, Luiz Edson. Direito Civil: sentidos, transformações e fim. Rio de Janeiro: Renovar, 2015.
FACHINNI NETO, Eugênio. A relativização do nexo de causalidade e a responsabilização da indústria do fumo – a aceitação da lógica da probabilidade. Civilistica, a. 5. n. 1, 2016.
FORGIONI, Paula. Teoria geral dos contratos empresariais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
FRADERA, Véra Maria Jacob de. Pode o credor ser instado a diminuir o próprio prejuízo? Revista trimestral de direito civil, Rio de Janeiro, v. 19, p. 109-119, jul./set. 2004.
GOETZ, Charles J; SCOTT, Robert E. The mitigation principle: toward a general theory of contractual obligation. Virginia law review. Vol. 69, n. 6, set. 1983, p. 967-1024. Disponível em: <http://www.jstor.org/stable/1072737>. Acesso em: 05 jul. 2015. GRAU, Eros Roberto. Notas sobre a distinção entre obrigação, dever e ônus. RFDUSP. São Paulo, v.77, pp.177-183, 1982.
HARKE, Jan Dirk. Allgemeines Schuldrecht. Heidelberg: Springer, 2010.
HILLMAN, Robert A. Keeping the deal together after material breach: common law mitigation rules, the UCC, and the Restatement of Contracts. S/l: Cornell Law Faculty Publications, 1976. Disponível em: <http://scholarship.law.cornell.edu/facpub/552>. Acesso em: 05 mar. 2015.
LOPES, Christian Sahb Batista. A mitigação dos prejuízos no direito contratual. Tese (Doutorado) – Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2011.
LOPEZ, Teresa Ancona. Responsabilidade civil na sociedade de risco. Revista da Faculdade de Direito (USP), v. 105, p. 1223, 2010.
LOS MOZOS, José Luis de. El principio de la buena fe: sus aplicaciones en el Derecho Civil Español. Barcelona: Bosch Casa Editorial, 1963.
MAHECHA, Eduardo Gamboa. La carga de mitigar los daños en el régimen colombiano de la responsabilidad civil extracontractual. Revista de Derecho Privado, Universidad de Los Andes, n. 51, pp. 1-23, jan./jun. 2014.
MARINONI, Luiz Guilherme. A ética do precedente: justificativa do Novo CPC. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.
MARTINS-COSTA, Judith. A boa-fé no direito privado: sistema e tópica no processo obrigacional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.
MARTINS-COSTA, Judith. Autoridade e utilidade da doutrina.
In: ________ (Org). Modelos de direito privado. São Paulo: Marcial Pons, 2014. MARTINS-COSTA, Judith. Comentários ao novo código civil: do direito das obrigações; do adimplemento e da extinção das obrigações. Vol. V, t. 1. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (Coord.). Comentários ao novo código civil. Rio de Janeiro: Forense, 2003.
MARTINS-COSTA, Judith. Responsabilidade civil contratual. Lucros cessantes. Resolução. Interesse positivo e interesse negativo. Distinção entre lucros cessantes e lucros hipotéticos. Dever de mitigar o próprio dano. Dano moral e pessoa jurídica. In:
LOTUFO, Renan et al. Temas relevantes de direito civil contemporâneo. São Paulo, Atlas, 2012.
MENEZES CORDEIRO, António Manuel da Rocha e. Da boa-fé no direito civil. Coimbra: Livraria Almedina, 1997.
MENEZES CORDEIRO, António Manuel da Rocha. Direito das Obrigações, v.1. Lisboa: Associação Acadêmica da Faculdade de Direito de Lisboa, 1986.
MENEZES, Joyceane Bezerra de. A reengenharia da responsabilidade civil na sociedade de riscos: da culpa à socialização dos riscos. In: Encontro Preparatório para Congresso Nacional do CONPEDI, n. 17, 2009, Salvador. Anais..., Florianópolis: Fundação Boiteux, 2008.
MIRAGEM, Bruno. Abuso de direito: licitude objetiva e limite ao exercício de prerrogativas jurídicas no direito privado. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil Brasileiro. v.4. São Paulo: Saraiva, 1979.
MONTIEL, Juan Pablo. Existen las Obliegenheiten en el Derecho penal? InDret, Barcelona, n.4, 2014.
MOTA PINTO, Carlos Alberto da. Teoria Geral do Direito Civil. 4ª Ed. Atualizada por Antonio Pinto Monteiro e Paulo Mota Pinto. Coimbra: Coimbra Editora, 2012.
NALIN, Paulo; MANASSÉS, Diogo Rodrigues. Responsabilidade civil extracontratual e contratual: razões e funções da distinção. pp. 337-356. In: RUZYK, Carlos Eduardo Pianovksi et al (Org.). Direito civil constitucional: a ressignificação da função dos institutos fundamentais do direito civil contemporâneo e suas consequências. Florianópolis: Conceito Editorial, 2014.
NEIRA, Lilian C. San Martín. La reducción del resarcimiento por culpa de la víctima: reflexiones a la luz del análisis de algunas fuentes romanas. Revista de Derecho Privado, Universidad Externado de Colombia, n. 27, pp. 35-67, jul./dez. 2014.
NEIRA, Lilian C. San Martín. Sobre la naturaleza jurídica de la ‘cooperación’ del acreedor el cumplimiento de la obligación: la posición dinámica del acreedor en la relación obligatoria, como sujeto no sólo de derechos sino también de cargas y deberes. Revista de Derecho, Universidad de Concepcion, n. 225-226, jan./jun. jul./dez. 2009.
NORONHA, Fernando. Desenvolvimentos contemporâneos da responsabilidade civil. Sequência, v.19, n.37, pp.21-37, 1998.
NORONHA, Fernando. O nexo de causalidade na responsabilidade civil. Revista dos tribunais, São Paulo, vol. 92, n. 816, pp. 736-737, out. 2003.
POSNER, Richard. Let us never blame a contract breaker. Michigan Law Review, v. 107, 2009.
SCALISE JR., Ronald J. Why no "efficient breach" in the civil law? A comparative assessment of the doctrine of efficient breach of contract. American Journal of Comparative Law. Ann Arbor, v. 55, p. 721-766, 2007. Disponível em: <http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2094379>. Acesso em 05 jul. 2015.
SCHMIDT, Jan Peter. Zehn Jahre Art. 422 Código Civil – Licht und Schatten bei der Anwendung des Grundsatzes von Treu und Glauben in der brasilianischen Gerichtspraxis. DBJV Mitteilungen, n.2, pp.34-47, 2014.
SCHREIBER, Anderson. Novas tendências da responsabilidade civil brasileira. In:
________. Direito civil e constituição. São Paulo: Atlas, 2013.
SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil: da erosão dos filtros da reparação à diluição dos danos. 4ª Ed. São Paulo: Atlas, 2012.
SILVA FILHO, José Carlos Moreira da. Hermenêutica filosófica e direito: o exemplo privilegiado da boa-fé objetiva no direito contratual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.
STEINER, Renata C. Descumprimento contratual: boa-fé e violação positiva do contrato. São Paulo: Quartier Latin, 2014.
TEPEDINO, Gustavo. Notas sobre o nexo de causalidade. Revista jurídica. a. 50, n. 296, junho de 2002.
TRONCOSO, María Isabel Troncoso. La obligación de tomar medidas razonables para evitar la extension del daño. Revista de Derecho Privado, Universidad Externado de Colombia, n. 21, pp. 353-391, jul./dez. 2011.
VELÁZQUEZ, Juan Pablo Pérez. La carga de evitar o mitigar el daño derivado del incumplimiento del contrato. InDret, Vol. 1, jan. 2015.
VIEIRA, Patricia Ribeiro Serra. O fenômeno da objetivação da responsabilidade na Lei civil brasileira. In:
TEPEDINO, Gustavo; FACHIN, Luiz Edson (Org.). O Direito e o Tempo: embates jurídicos e utopias contemporâneas. 1ª ed. Renovar: Rio de Janeiro, 2008.
WIEACKER, Franz. El principio general de la buena fe. Madri: Civitas, 1986.
WILSON, Carlos Pizarro. Contra el fatalismo del perjuicio: a propósito del deber de mitigar el daño. Revista de Derecho de la Pontificia Universidad Católica de Valparaíso, n.41, pp.69-82, 2013.
ZANETTI, Cristiano de Sousa. A mitigação do dano e alocação da responsabilidade. RBA, n.35, jul-set/2012.